
Las Vegas está enfrentando uma temporada de verão atípica. Os hotéis da Strip, acostumados a operar com ocupação quase total durante os meses mais quentes do ano, estão vendo seus corredores mais vazios do que o normal. A razão? Uma combinação de fatores econômicos e políticos, com destaque para as restrições impostas pelo governo Donald Trump, que têm afetado diretamente o turismo internacional e a força de trabalho local.
Dados preliminares da consultoria Smith Travel Research (STR) indicam que a ocupação hoteleira em Las Vegas caiu 14,9% em junho, marcando o pior desempenho mensal do ano. A tendência negativa continuou em julho, com uma queda de 16,8% na semana encerrada em 5 de julho, levando a receita por quarto disponível (RevPAR) a despencar 28,7%, chegando a US$ 102,75.
Esses números não são apenas estatísticas: eles refletem uma mudança significativa no comportamento dos viajantes e nas dinâmicas do setor. Sem os habituais turistas estrangeiros e com o consumidor americano mais cauteloso, os hotéis estão tendo que se reinventar para manter as luzes acesas.
Turismo internacional em queda
Um dos principais motores da economia turística de Las Vegas sempre foi o visitante estrangeiro. Antes da pandemia, cerca de 20% dos turistas vinham de fora dos Estados Unidos. Em 2025, essa proporção caiu drasticamente. A chegada de visitantes internacionais teve uma queda de 13,2% em junho, com destaque para o recuo acentuado de canadenses e mexicanos.
As causas são múltiplas, mas as políticas de imigração e comércio adotadas pelo governo Trump têm sido apontadas como catalisadoras. Tarifas sobre produtos canadenses e mexicanos, além de uma retórica agressiva contra estrangeiros, geraram receio entre turistas e levaram alguns países a emitir alertas de viagem para os EUA.
A repressão à imigração também tem causado impacto direto na força de trabalho da cidade. Cerca de 74% dos funcionários da hotelaria em Las Vegas são imigrantes. Com o aumento das operações do ICE (Serviço de Imigração e Alfândega, em português), muitos trabalhadores estão com medo de ir ao trabalho, e alguns estabelecimentos, como o Broadacres Marketplace, chegaram a fechar temporariamente para proteger seus funcionários.
Esse clima de insegurança afeta não apenas os trabalhadores, mas também os visitantes. Protestos em frente ao Trump Hotel e relatos de turistas sendo interrogados sobre suas redes sociais na imigração contribuem para uma imagem menos acolhedora.
Hotéis reagem com descontos agressivos
Diante da queda na demanda, os hotéis da cidade estão apostando em promoções agressivas para atrair hóspedes. O Resorts World Las Vegas lançou o pacote “All Resort, No Fees”, que elimina taxas de resort, oferece estacionamento gratuito e créditos diários de US$ 50 a US$ 75. O Sahara Las Vegas permite que o hóspede escolha entre eliminar a taxa de resort ou receber um crédito diário de US$ 50 em alimentação.
Outros hotéis, como o Caesars Entertainment e o The Strat, também estão oferecendo descontos significativos em diárias, serviços de spa e atrações. O Circa Resort & Casino criou um pacote de verão de US$ 400 que inclui duas noites de hospedagem, US$ 200 em créditos e reserva de espreguiçadeira na piscina.
A Las Vegas Convention and Visitors Authority (LVCVA) aprovou um aumento de 30% no orçamento de marketing, o maior da história da entidade. A campanha foca em mostrar que a cidade tem opções para todos os bolsos, tentando reconquistar o público que se afastou por questões econômicas.
Segundo Steve Hill, CEO da LVCVA, a cidade já esperava um verão mais fraco, mas a intensidade da queda surpreendeu. Ele aponta a baixa confiança do consumidor como um dos principais fatores, agravado pelas políticas do governo federal.
“A incerteza [econômica] que se agravou ultimamente fez com que aqueles que se preocupam com o orçamento, que é a maioria de nós, pensassem duas vezes”, disse em entrevista ao site Travel Weekly.
Efeitos em cascata no ecossistema da cidade
A queda na ocupação hoteleira em Las Vegas não afeta apenas os hotéis. Restaurantes, cassinos, lojas e atrações turísticas também sentem o baque. O turismo representa cerca de 28% do emprego em Nevada e 37% do PIB do estado. Com menos visitantes, há menos consumo, menos impostos arrecadados e mais risco de demissões.
O setor de jogos, por exemplo, viu uma queda de 4,8% na receita em março de 2025, e a arrecadação de impostos sobre quartos deve cair 5% no próximo ano fiscal, que se inicia em outubro.Apesar do cenário desafiador, há sinais de esperança. As reservas para convenções e feiras comerciais no segundo semestre estão fortes, com aumento de 10,7% na participação em maio. Eventos corporativos e grandes shows continuam sendo uma aposta segura para os hotéis, que veem nesses segmentos uma fonte mais estável de receita.
Especialistas acreditam que, com o fim do verão e a chegada do outono, a ocupação deve melhorar. Mas para que Las Vegas volte a brilhar como antes, será necessário mais do que promoções: será preciso reconstruir a confiança dos viajantes, especialmente os internacionais.