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Blogs / Points de Vue

Do Reino Unido até o Brasil, o choque da queda de um ícone do turismo

O anúncio da falência da Thomas Cook, a mais antiga operadora de turismo do mundo, foi um choque brutal não somente para os seus clientes – 600 mil dos quais vão ter que encontrar um meio de voltar das suas ferias-, para seus 22 mil funcionários, e para todos os profissionais. Para todos, é difícil entender como uma empresa nascida em 1841, ícone do setor e muito tempo pioneira, passou em poucos dias de uma situação de dificuldade financeira a uma verdadeira falência. Esquecendo famosos exemplos do setor – desde a Pan Am até a VARIG-, muitos pensaram até a última hora que o governo inglês iria injetar os 200 milhões de libras que ainda faltavam para fechar um plano de salvação da firma de Petersborough. Mas o governo simplesmente lembrou que o contribuinte não podia financiar “patos aleijados”.

Com um prejuízo de 1,5 bilhão de libras em 2018, 15% do seu faturamento, a má situação financeira do grupo fundado em 1841 era conhecido de todos. Além da concôrrencia do outro gigante europeu, a TUI, das migrações dos clientes mais jovens para as vendas diretas on-line, do desafeto do mercado para os pacotes fechados, e do sucesso das companhias low cost, a Thomas Cook teve de enfrentar na Inglaterra as incertezas do Brexit e a queda da libra. Para se livrar do peso da sua dívida, o grupo ainda tentou durante o verão de renegociar com seus principais acionistas, o chinês Fosun, bancos ingleses e fundos americanos, um plano de reestruturação de 900 milhões de libras. Mas esta esperança sumiu na sexta-feira passada quando os “hedge funds” exigiram 200 milhões suplementares que inviabilizaram o projeto.

Pela sua peculiar história, a Thomas Cook teve também uma presença no Brasil. Tendo sido comprada em 1928 pela Compagnie Internationale des Wagons lits et du tourisme, ela participou até os anos oitenta da sua epopeia. Fusionando as duas redes de agências, as duas empresas tinham divido o mundo entre a Wagons lits que operava na Europa e na América Latina, e a Thomas Cook que operava no Reino Unido, na América no Norte e nas antigas colônias inglesas. Assim as primeiras agências da Wagons lits abertas em 1934 no Rio de Janeiro e em 1936 em São Paulo se chamavam Wagons lits//Cook. Mudaram de nome somente em 1976 quando o acordo entre as duas empresas caducou, mas uma forte ligação foi ainda mantida durante mais de dez anos. As agências brasileiras – oito em 1980, treze em 1985- passaram a se chamar Wagons lits turismo, associadas a Thomas Cook.

Durante a década de 1980, as duas se separam completamente, assumindo escolhas estratégicas totalmente opostas. Após de passar sob o controle da SODEXO e depois da Accor, a Wagons lits fusionou com a americana Carlson, e abandonou suas agências e suas operadoras para se concentrar nos serviços corporate e virou a segunda maior empresa mundial neste setor. A Thomas Cook fez a escolha inversa, se aproximou da alemã Neckerman e apostou nas agências e no turismo de lazer, favorecendo a verticalização com a compra de hotéis e o desenvolvimento da sua própria companhia aérea. Trinta anos depois, a situação das duas mostrou que a Accor e os então dirigentes da Wagons lits tinham feito a escolha certa.

As consequências da falência serão pesadas para todo o setor, e em numerosos países onde a Thomas Cook era muito forte como a Alemanha, a Bélgica, a Índia, a França. Os hoteleiros dos destinos mais vendidos pelas suas agências – Espanha, Turquia, Tunisia – se preparam também para graves prejuízos diretos e indiretos, falta de pagamentos e dificuldades para encontrar como substituir as clientelas. Os administradores judiciais, Alix Partners e KPMG, deveriam agora tentar vender as atividades e as filiais separadamente, com prioridade para as companhias aéreas – especialmente a Condor- que ameaçam parar a qualquer momento. Longe de se alegrar, os grandes concorrentes estão também preocupados pela desconfiança dos investidores que a queda desse leader pode trazer para o turismo. Um fim triste depois de 178 anos de atividade.

Jean-Philippe Pérol

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